RN: insegurança até nos dadosPublicação
domingo, 16 de março de 2014
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Nadjara Martins e Sara Vasconcelos
Repórteres para o Tribuna do Norte
A primeira vez foi no Santarém, zona norte de Natal. Dois rapazes, em uma bicicleta, levaram o celular dela e de outras duas amigas. Na segunda, virou refém no ônibus: um rapaz encostou a arma na cabeça dela, e ameaçou atirar caso os passageiros não entregassem os pertences. Na terceira, outro rapaz de bicicleta a abordou a luz do dia, também no Santarém. Levou a bolsa, com todos os documentos e R$300. Na quarta e na quinta vez – um arrastão no coletivo e uma abordagem de moto – não levaram nada de valor. Na última vez, em dezembro de 2013, o assaltante não se contentou em roubar R$100. Gabriely Morais, técnica em radiologia, ganhou um tapa na cara. A razão? Não estava com o celular.
Junior Santos
Números de crimes e vítimas da violência só crescem no RN: homicídios mais que dobraram em 10 anos; já a quantidade de inquéritos que investigam essas mortes não representa nem 20% dos casos
Gabriely é só mais um número. Em 2013, foram registrados 2.789 assaltos a transeuntes na capital potiguar. Outros 203 assaltos foram registrados nos ônibus da cidade. Mas os furtos são só apenas a ponta do iceberg que simboliza a criminalidade no Rio Grande do Norte. O índice de mortes por arma de fogo, por exemplo, cresceu em 110% entre 2000 e 2010, segundo o estudo Mapa da Violência, divulgado no ano passado. Em 2013, foram registrados 1653 homicídios no estado – 434 casos a mais do que em 2012. Neste ano, já foram registradas 330 mortes, somente até a última quinta-feira, de acordo dados do Conselho Estadual de Direitos Humanos e Itep/RN.
Mesmo com os altos índices, a taxa de resolutividade desses crimes é menor a cada esfera do poder público pelo qual perpassam – desde o início das investigações pela Polícia Civil até o julgamento do culpado pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte. Dos homicídios registrados em 2013, 299 inquéritos foram gerados e somente 4% solucionados. A causa apontada por todas as instituições criminais do estado são praticamente as mesmas: falta estrutura de trabalho, faltam recursos humanos. O resultado é a impunidade, que retroalimenta o mundo do crime. Para se ter uma ideia, a taxa de presos que retornam a praticar delitos é de 80%. A TRIBUNA DO NORTE fez um levantamento do caminho que um homicídio faz no sistema criminal até ser julgado. A burocracia que emperra o andamento dos inquéritos – e, por conseguinte, a punição do culpado –, está presente em todas as esferas. Acompanhe.
Entidades se mobilizam
Cada órgão oficial procurado pela reportagem afirmou que existem medidas sendo tomadas para reestruturar o sistema de Segurança do Estado. De acordo com a Polícia Civil, já existe um processo em andamento para a compra de 400 pistolas e coletes a prova de balas, que deve sair até o final do mês. Quanto à reposição do efetivo, porém, a Degepol aguarda uma definição do Governo do Estado. Com a convocação, seria possível criar a Divisão de Homicídios – uma aposta da instituição para dar maior resolutividade aos casos de homicídios, mas que ainda não saiu do papel. O projeto faz parte do Programa Brasil Mais Seguro prazo para junho deste ano. A Divisão contaria com 80 policiais.
Segundo a Secretaria do Estado de Justiça e Cidadania (Sejuc), estão sendo construídos sete novos centros de detenção como uma medida resolutiva para a carência de vagas no cárcere potiguar. Com todas as obras serão criadas 1.700 novas vagas para o regime fechado e 300 para o regime semiaberto.De acordo com o secretário estadual de justiça, Júlio César de Queiroz, também foram adotadas medidas para reintegração social do preso a partir de programas de capacitação e do estímulo para que os apenados possam trabalhar dentro dos presídios.
Já o Ministério Público e o Tribunal de Justiça do RN trabalham com a meta Enasp (Estratégia Nacional de Justiça e Segurança Pública), definida pelo Conselho Nacional de Justiça em 2010, para liquidar todos os inquéritos de homicídios que aguardam resolução. Na última sexta-feira (14), o MPRN lançou projeto para combater as subnotificações de homicídio no estado. “Vamos tentar, nos primeiros seis meses, traçar um relatório da situação que encontramos de inquéritos em aberto e o que podemos fazer. O prazo da meta Enasp ainda é prorrogável”, apontou o promotor Edevaldo Barbosa.
O TJRN inicia amanhã a Semana Nacional do Júri, que dá início ao cronograma de execução de processos por todos os tribunais do país. Durante esta semana, 17 juízes vão ser responsáveis por julgar 49 dos cerca de 720 processos de homicídios que estão parados. A previsão é que os demais processos sejam julgados até outubro deste ano – o cronograma prevê julgamentos mensais nas diversas comarcas do estado. “Não dá para dizer que vamos cumprir tudo, até porque as dificuldades para encontrar e transferir réus se mantém. Mas estamos fazendo um esforço para cumprir a meta”, finalizou o juiz auxiliar da Presidência do TJRN, Fábio Filgueira.