CABO É PUNIDO POR NÃO LIBERAR VEÍCULO DE MULHER DE CORONEL EM ABORDAGEM NO TRÂNSITO
Denúncias de abuso de autoridade sobre oficiais de alta patente da Polícia Militar em blitzes - ou mesmo outras situações - como a que aconteceu com o tenente-coronel José Dirceu Pereira, acusado de intimidar policiais durante fiscalização da Lei Seca no dia 13 de outubro, na Reta da Penha, em Vitória, após sair de uma boate, são frequentes. Os praças - homens que possuem patentes inferiores - costumam sofrer represálias.
A reportagem teve acesso a documentos de outro caso semelhante, registrado em janeiro deste ano. De acordo com esses documentos, na ocasião, um cabo, com 16 anos de trabalhos prestados ao Batalhão da Polícia Rodoviária (BPRv), ligado ao 10º Batalhão da Polícia Militar (BPM), localizado em Guarapari, abordou um veículo conduzido pela mulher de um coronel e constatou uma série de irregularidades. Ele autuou a mulher e, dias depois, foi transferido para o interior de Linhares, mesmo tendo residência e família em Vitória, sob alegação de que havia necessidade de serviço, o que não foi comprovada.
Mulher de coronel dirigia com criança de três anos no colo
Ainda de acordo com os documentos, o cabo e um soldado foram até a localidade de Palmeiras, em Guarapari, para recolher um carro que estava abandonado há mais de 15 dias. No caminho, se depararam com um Fusca conduzido por uma mulher e fizeram a abordagem padrão. Ela não portava documentos do veículo e nem pessoal, transportava três crianças menores de idade soltas no carro - com uma de aproximadamente 3 anos em seu colo. A mulher e as crianças não usavam cinto de segurança, além do veículo não estar licenciado.
Durante a autuação, um senhor chegou no local de bermuda e camisa gola polo, como frisa o documento, em um carro oficial. O homem questionou o que estava acontecendo, e após ouvir a resposta do cabo, retornou ao veículo e pegou uma identidade militar e se apresentou ao policial como sendo o coronel Henrique Grecco.
O praça, relata o documento, se portou militarmente ao coronel, que em seguida buscou o celular no carro e ligou para para o tenente-coronel Walace Brandão, então comandante do Batalhão da Polícia Rodoviária (BPRv), solicitando que o veículo fosse liberado do local, ao qual havia sido acionado o guincho para recolhimento em pátio e os procedimentos administrativos.
O documento relata que os militares do BPRv escutaram a conversa e entenderam que o tenente-coronel não teria liberado o veículo. Nesse momento, o coronel Henrique se dirigiu à sua esposa, a condutora do veículo, e determinou que ela retirasse o Fusca apreendido pelos militares daquele local. O cabo perguntou se esta seria uma determinação, e o mesmo afirmou que sim, e que poderia anotar as providências devidas que ele estava indo embora.
Tenente-coronel nega
Procurado pela reportagem, o então comandante do Batalhão de Trânsito, tenente-coronel Walace Brandão, não quis comentar o ocorrido para não atrapalhar as investigações do caso, que ainda está sendo apurado pela Corregedoria da Polícia Militar. Mas garantiu que não liberou a esposa do coronel Henrique Grecco, para não ferir a lei. “Não liberei. Garanto isso. Para não ferir a legislação. E sei que isso gerou uma série de consequências”, resumiu Walace Brandão.
Desdobramentos
Dias após o ocorrido, o coronel Henrique foi promovido ao Comando e Policiamento Ostensivo Especializado. O cabo, com 16 anos de Batalhão de Trânsito, foi transferido para o interior de Linhares, para o policiamento comum.
Procurado pela reportagem para falar sobre o caso, o presidente da Associação de Cabos e Soldados do Espírito Santo, Cabo Flávio Gava, confirmou a história e afirmou que as denúncias de abusos de poder por parte de altas patentes são frequentes.
A Polícia Militar foi procurada para se pronunciar sobre o caso, mas a assessoria de comunicação informou que a PM só vai se manifestar quando o inquérito for concluído.
Fonte: GAZETA ONLINE