Associação de Cabos e Soldados pede dinheiro a comerciantes em Mossoró e estes se dizem intimidados
O Comando-Geral da Polícia Militar do
Rio Grande do Norte é contra a
utilização do nome da instituição para
realização de eventos que objetivam
arrecadar dinheiro junto a
comerciantes e empresários. A
orientação é que, ao ser abordado
por um policial militar pedindo ajuda
financeira, o cidadão não se deixe
intimidar. Muitos contribuem sem
entender qual a real finalidade. O
dinheiro não é direcionado à Polícia
Militar. Na verdade, o apurado vai
para as associações, que são
independentes da PM.
Em Mossoró, vários comerciantes e
empresários compraram cartelas
oferecidas pela Associação dos Cabos
e Soldados (ASC) da PM. Um dos
compradores (nome fictício), José
Antônio (pediu para não ser
identificado por temer sofrer alguma
represália) disse ao DE FATO que
comprou por acreditar que estaria
ajudando a Polícia Militar e não uma
instituição particular, como é o caso
da ACS. O primeiro contato foi feito
por telefone, em nome de um “oficial,
na ACS não existem oficiais, que são o
alto escalão da corporação; são
apenas cabos e soldados. Por
telefone, Paulo aceitou ajudar.
Ele conta que se comprometeu a
comprar uma cartela no valor de R$
100, 00, no entanto foi surpreendido
por um policial que foi ao seu
estabelecimento, usando farda,
armamento e um carro da Polícia.
“Ligaram me oferecendo uma cartela
que era para esse bingo beneficente.
Perguntaram se eu podia comprar.
Disse que compraria uma e eles
chegaram com três, relembra José
Antônio, frisando que, ao se recusar a
comprar as três, sentiu-se intimidado.
O policial fez um gesto de
desaprovação e disse que iria
comunicar ao “oficial que ele havia
descumprido o acordo firmado pelo
telefone.
Mesmo estando fora de suas
possibilidades financeiras naquele
momento, José Antônio comprou
duas cartelas (R$ 200,00) para
agradar o policial. “O que me levou a
comprar foi que eles ligaram para
mim como se fosse uma pessoa
muito conhecida minha. Falou em
nome da Polícia, que estava
precisando de ajuda. Então pensei
assim: se é para ajudar, eu vou
comprar pelo menos uma. Eles
queriam me obrigar a comprar três.
Quando disse que só queria uma, ele
se chateou comigo e disse que ia
relatar ao oficial. Foi com um ar de
quem estava com raiva e que eu
estava descumprindo a palavra,
conta.
Um outro comerciante ouvido pela
reportagem (nome fictício), José
Carlos, também passou pela mesma
situação. Primeiro, recebeu uma
ligação e disse que compraria uma
cartela para “ajudar, sem saber ao
certo para onde estaria dando sua
contribuição. O policial que foi ao seu
estabelecimento, assim como no caso
de José Antônio, levou cartelas extras,
além do que havia sido combinado
pelo telefone. José Carlos afirma ter
ficado preocupado com as
consequências da sua “não
contribuição, temendo ter o
policiamento prejudicado em seu
ponto, e acabou cedendo,
comprando duas cartelas.
Associação garante legalidade nas
ações
A Associação dos Cabos e Soldados
(ACS) da Polícia Militar do Rio Grande
do Norte garante que todas as ações
realizadas pela instituição são
amparadas legalmente pelas leis.
O cabo Queiroz, que é um dos
diretores da ACS, afirma que os
doadores recebem esclarecimento
sobre os fins daquela arrecadação
financeira. Na cartela é informado que
é da ACS e o pessoal explica como é
realizado o sorteio, explica o policial
militar.
Queiroz acrescenta ainda que os
comandantes dos Batalhões da PM no
interior são avisados com
antecedência sobre a realização
desses sorteios.
“Só contribui quem quer; é uma
ajuda, garante o diretor da
Associação, reforçando que não é
feita nenhuma promessa de
favorecimento pessoal para quem
resolva contribuir, tipo maior
presença da Polícia Militar no
estabelecimento do dono que tenha
participado.
“A pessoa faz uma doação e em troca
participa do sorteio, destaca Queiroz,
lembrando que já houve empresas
premiadas em Mossoró noutros
sorteios realizados pela entidade.
Queiroz lembra ainda que a cartela
entregue aos doadores contém todas
as informações necessárias. No
panfleto, não existe realmente
nenhuma alusão à Polícia Militar, em
específico. Eles afirmam que o
dinheiro será revertido “na reforma e
abertura de novas regionais no
interior do Estado.
O último sorteio foi feito no dia 11 de
dezembro do ano passado, data que
foi comemorado o aniversário da
ACS, em Natal. A associação fica na
Avenida Prudente de Morais, 5130,
Lagoa Nova, Natal.
PM não tem ligação com as
instituições
Segundo o coronel Francisco Araújo
Silva, comandante- geral da Polícia
Militar no Rio Grande do Norte, não
existe nenhuma queixa formal contra
a realização das atividades que
objetivam arrecadar dinheiro feitas
pelas associações que representam
classes da Polícia Militar.
No entanto, ele faz questão de deixar
bem claro que essa doação não irá
ajudar a instituição, como muitos
colaboradores acreditam ao participar
dos eventos. “A Polícia Militar do Rio
Grande do Norte desconhece
qualquer atividade dessa natureza. Se
está sendo feito algo em nome da PM,
não é permitido. Não temos nenhuma
gestão sobre esse dinheiro e não
sabemos para onde ele vai.
De acordo com Araújo, caso os
policiais que integram essas
associações estejam utilizando o
nome da corporação ou até mesmo a
estrutura (farda, armamento, viatura,
etc.) , serão responsabilizados através
de procedimento administrativo
interno e investigação criminal, já que
cometem crime.
“Se alguém usa o nome da Polícia
Militar ilicitamente, não é a instituição.
A Associação de Cabos e Soldados é
uma entidade privada que não tem
vínculo com a Polícia Militar. Para ser
sócio, tem de pagar. A PM não tem
gestão sobre essa entidade, esclarece
o coronel.
Araújo afirmou ontem à tarde que o
Comando-Geral da PM/RN
desconhecia a utilização da estrutura
da corporação por integrantes das
associações e que será aberto um
procedimento para investigar o caso.
“Estamos tomando conhecimento
agora. Se estão usando viatura para
fazer esse tipo serviço não é
permitido. Será feita uma
investigação, diz Araújo.
Fonte: www.defato. com (Jornal de
Fato)