RN tem o 3º maior índice de mortes sobre duas rodas do Nordeste

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

De Sérgio Henrique Santos, especial

para o Diário de Natal

Macas retidas na porta do maior

hospital público do Rio Grande do

Norte. O cenário típico de uma

segunda-feira no Hospital Walfredo

Gurgel é reflexo do alto índice de

atendimentos no setor de politrauma

por causa dos acidentes de moto

durante os finais de semana.

Quarenta e dois por cento das vítimas

de acidentes de trânsito no Estado

são decorrentes de motocicletas, o

que representa o 3º maior índice do

Nordeste, região que detém o maior

mercado consumidor, e que comprou

no ano passado, 35% de todas as

motos vendidas no país. O RN só

perde para Sergipe, com 44%, e Piauí,

que lidera o ranking com quase

metade das pessoas que morreram

no trânsito quando estavam sobre

duas rodas.

Por causa esse assunto, o Rio Grande

do Norte foi destaque no último

domingo em matéria exibida pelo

Fantástico, da Rede Globo. O

Ministério da Saúde se mostrou

preocupado com a liderança do

Nordeste. "Quase 80% dos óbitos por

motocicletas são de pessoas entre 15

e 39 anos", declarou o ministro

Alexandre Padilha. Mossoró foi

apontada pela reportagem como a

maior frota proporcional do país. Um

em cada quatro moradores da

cidade, distante 285 quilômetros da

capital, é motociclista.

De acordo com o setor de estatísticas

do Departamento Estadual de

Trânsito (Detran), a frota de motos no

Estado é de 302. 141 veículos, o que

corresponde a 34,92% de um total

liderado pelos automóveis (45,23%).

Natal tem 71.521 motos (23,67 %), e

Mossoró, 42.871 (14,19% do total no

estado). As outras cidades do interior

detém 63,14% da frota, o que

preocupa as autoridades de saúde

pública.

O médico Domício Arruda, titular da

Secretaria Estadual de Saúde (Sesap),

afirma que é previsível o aumento do

número de acidentados entre a noite

da sexta-feira e a manhã do domingo

nos maiores hospitais da rede. "O

problema tem se agravado a cada dia.

Hoje, por sinal, esse é o principal

motivo de internação na parte de

traumatologia dos maiores hospitais

do Estado. Outra preocupação é o

interior do Estado, onde está a maior

parte das motocicletas e muitas vezes

o deslocamento para esses hospitais

de referência atrasam o socorro

médico. Infelizmente, às vezes, a

demora é fatal", afirma.

A cada três dias, uma pessoa morre

por causa de problemas com

acidentes de moto no perímetro entre

a região metropolitana de Natal e a

região do Mato Grande.

"Proporcionalmente morre mais gente

nessas regiões do que nas regiões

metropolitanas de São Paulo (1, 5 por

dia) e Rio de Janeiro (um a cada dois

dias). Isso é grave porque temos que

levar em conta que estas metrópoles

são muito mais populosas que nossa

região", destaca o ortopedista e

traumatologista Julimar Nogueira, do

Hospital Walfredo Gurgel.

No HWG, a média de atendimento

por acidente de moto gira em torno

de 80 a 90 acidentados por final de

semana, o pico semanal dos traumas.

"Vivemos uma epidemia no trânsito

por causa dos acidentes por moto. A

maioria causa severos danos ao

paciente, seus familiares e à

sociedade por se tratar de vítimas que

permanecem afastadas do seu

trabalho. Esta situação deve ser

encarada como um problema de

saúde pública. Há um grande numero

de doentes com sequelas, uma legião

de sequelados - a maior parte sem

produzir. Gera um custo muito alto

tanto para a assistência quanto para

previdência", colocou o médico.

Influência do álcool

Na grande maioria dos acidentes, as

vítimas estão alcoolizadas. "A mesma

motocicleta que é usada durante a

semana para trabalhar, vira veículo de

lazer nos finais de semana", diz

Domício Arruda. Por causa da relação

álcool e uso de veículos como motos

e carros, o problema se agrava. Quem

pilota uma moto após beber, por

exemplo, põe em risco a vida de

outras pessoas, além de si próprio.

Para tentar diminuir o uso de álcool

nas estradas durante o verão, a

Secretaria Estadual de Segurança

Pública (Sesed) intensificou as blitzen

e testes de bafômetro nas estradas

que são os principais destinos dos

veranistas. "Esperamos que, após a

Operação Verão, as estatísticas

melhorem. Ainda é cedo para

observar os resultados", contou

Arruda.

O coronel Francisco Canindé de

Freitas, comandante da Polícia

Rodoviária Estadual (CPRE) disse que

a partir desse mês de janeiro foram

intensificadas as operações para

coibir irregularidades sobre duas

rodas. No final de semana passado

foram apreendidas 60 motocicletas

por diversos motivos: falta de

capacetes, carteiras de habilitação e

outros equipamentos obrigatórios.

Foram realizados 1.800 testes de

bafômetros, mas nenhum

motociclista foi flagrado bêbado. "O

trabalho está sendo feito não para

diminuir a quantidade, e sim a

gravidade de acidentes", afirma

Freitas.

Para o comandante, os acidentes são

praticamente inevitáveis. "No

momento em que não se ampliam as

rodovias, nem é possível diminuir o

aumento das vendas de novas motos,

cabe ao CPRE trabalhar para que a

legislação de trânsito seja cumprida.

Fiscalizando assim queremos reduzir

a gravidade desses casos", explicou.

Mossoró: maior frota proporcional

do país

Mossoró, a maior cidade do interior

do Rio Grande do Norte,

proporcionalmente, tem a maior frota

de motos do Brasil. A cada quatro

moradores, um é motociclista. No

maior hospital regional do Oeste do

Estado, o Tarcísio Maia, a demanda

por este tipo de atendimento também

tem sido alta, a exemplo do Walfredo

Gurgel em Natal. "Ao assumir a

direção, em fevereiro do ano

passado, estudamos todos os setores

do hospital e encontramos dados

extremamente preocupantes. 75%

dos acidentados de trânsito aqui na

cidade têm relação com

motocicletas", conta Ney Robson,

diretor do hospital mossoroense.

Mossoró e região totalizou, no ano

passado, 6.668 acidentes de moto,

68% do total de ocorrências, ante

1.002 acidentes com carros (10% do

total). Outros tipos de acidentes

registrados no Hospital Regional

Tarcísio Maia (HRTM), 2.142 (22% do

total) correspondem a ocorrências

com tração animal, capotamento,

atropelamentos e com bicicletas.

Para tentar minimizar o problema, o

HRTM criou o Fórum Permanente do

Trânsito de Mossoró, econvocou

instituições como Ordem dos

Advogados do Brasil (OAB) Câmara de

Dirigentes Lojistas (CDL), Rotary, Lions,

Ministério Público e polícias

rodoviárias estadual (CPRE) e federal

(PRF) , entre outros parceiros, como as

autoescolas. "Agimos em duas

frentes. A curto prazo, em ações de

combate ostensivo às irregularidades

de trânsito, com aplicação da lei seca;

e num olhar de médio e longo prazo,

investindo na educação de trânsito

através do Detran e em reuniões com

a sociedade civil. Este é um problema

de saúde pública grave e que tem que

ser enfrentado como tal", classificou

Ney Robson.

Epidemia nacional

Hoje o Ministério da Saúde já encara

o problema como uma epidemia

nacional. "Não adianta abrir mais

leitos e leitos de Unidade de Terapia

Intensiva (UTIs) se os acidentes são

uma 'doença evitável' , digamos assim.

Para evitar acidentes, temos que

preveni-los. Por isso a importância da

conscientização", diz Domício Arruda,

da Sesap. A média diária de

acidentados com motos que dão

entrada no HWG, na capital potiguar,

é de 20 ocorrências. Segundo o

cirurgião geral, Geraldo Bezerra, os

acidentes de moto atendidos no setor

de politrauma vão desde os casos

mais simples como arranhões até

situações mais graves como

traumatimos cranianos ou

abdominais.

Ele também aponta as facilidades

oferecidas pelas concessionárias, a

economia com o reabastecimento,

aliada à imprudência de alguns

motoqueiros como os fatores

preponderantes para ocorrências do

tipo. "O binômio moto/ álcool é

responsável por 90% dos

atendimentos registrados no

Walfredo", conta. O cirurgião alerta

para a necessidade de uma

fiscalização mais rigorosa e de um

melhor policiamento, inclusive nas

cidades do interior. O médico critica o

fato de que há localidades no Rio

Grande do Norte onde até os

prefeitos proíbem o uso do capacete,

sob o argumento de que, dessa

forma, são coibidos assaltos.


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